Sunday, November 19, 2006

mar, mas de concreto. o que é ruim para mergulhos de memória

já faz algum tempo. ando distante, ainda que lhe passe pelas beiradas. eu e o mar temos uma relação estremecida pelas angústias das mudanças entre cidades, regiões, países, continentes.

mas continuo fiel ao atlântico, ainda que o tenha experimentado por outro lado a 18 graus, o que deixou-me momentaneamente capado. corroborou a minha postura de jamais capar um animal como solução anti-conceptiva.

são 15 anos longe do mar de fortaleza. a contagem pode não ser exata porque aqui estive por duas vezes neste período. mas estava tão fantasiado de executivo que de mar nem marola nem mariola.

desta vez, é diferente. já dou-me ao luxo de ser um executivo de bermudas. e ainda que não gato, de botas, e a metade de cima com uma, literalmente, boa e velha t-shirt dim para compor o visual que me faz assim algo europeu em meio aos europeus de verdade, que até duvidam, mas findam acreditar pelo detalhe da rasura da camiseta com seus buraquinhos por onde escapam-me meus ofícios de lembrança. por isso, agora já vai dar mais pé, inclusive nas areias, de iracema a mucuripe, por enquanto, só para barrufar as vontades, nestas que de praias agora apenas nome.

passo pela camarão do osmar, aquele bar famoso aos pés do mirante, um dos lugares mais lindos de fortaleza, que a crueza de administrações sucessivas, por não incorporá-lo à cidade, transformou numa faixa de gaza. burrice extrema de um capitalismo estúpido. que permite por duras penas a favelização agressiva em sentimento de uma das mais belas vistas já vista de uma cidade. na mesma moeda que se fossem eles habitantes, os ricos, não permitiriam aos pobres vê-las. fazem-lhe o mesmo a periferia estralada, na ameaça da barra pesada aos curiosos.

mas de dia dá. só não deu para o jô soares que ao tentar passar no famoso beco do camarão do osmar, ficou entalado, o que tornou o beco, e o restaurante, tão famoso como a sua comida, guardiã de inúmeros diplomas das revistas especializadas. deu-se um jeito e o jô entrou por casa anexa, e foi um banquete.

para mim não houve jeito. não no beco, que ainda passo folgado, respeitoso, como deve de ser. mas no mirante. na procura do meu bar preferido. que parece ainda estar lá, mas numa tarde de domingo, mais abandonado que criança abandonada, cadeiras viradas, dúzias de bares fechados e um cheiro de esturro no ar quente, não consigo identificar. como? se nem bêbados nas calçadas há.

será o domingo? será que tudo mudou para além da quantidade de prédios que agora mais e mais tapam o horizonte e o mar? concorrência insana com os casebres das favelas. alguns muito dos tão arrumadinhos, que dão vontade de morar. quase uma joaninhas junto aos pescoços de girafa dos 15, 18, 22 andares que começam a lhes cercar. não se sabe se aperto de apaixonado ou de desejo de sufoco.

sem mirante, sem quadrante, futuro morador, fico sem pistas, do que não sei o que pior nesta volta a fortaleza: a visão de que o futuro piorou um passado que já era temível ou a concretização do previsível da base ao topo. assim esquadrinhado pela luta desigual da crueldade da miséria que violenta a sí própria e os além fronteiras ou a crueldade da opressão dos já limítrofes que não percebem-se comprimindo até estourar um tumor criado por ela própria. cujo carnicão é a sua indiferença. que é um tapa tudo o que não aceita o mirante. ficar de olhos e boca fechada. por isso mesmo, punhos fechados, a limpo ou sempre empunhando alguma coisa que não vai acabar bem, quem duvidar que cisque, por onde pensam em passar.

quanto ao momentaneamente capado, não sei se sabe, ao entrar numa água demasiado fria, ainda mais em pleno verão, o choque térmico faz com que os testículos subam e alojem-se na cavidade onde o susto é menor que o diâmetro. mas passado ao susto tudo volta ao normal.

no mirante, anda muita gente a tomar susto assim por conta de frios n´alma de outra ordem. aí os ditos cujos não recolhem. pelo contrário. afrouxam. e desistem de encarar a normalidade de frente.

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