Friday, September 01, 2017

(mesmo que não seja grande coisa) poema de pirlimpimpim

hoje escrevi um poema
e fiquei muito contente
porque escrevi um poema

não que fosse grande coisa
mas era como se fosse

adolescente em acne
beijo de primeira língua vez
das pragas femininas varizes  
gânglio atômico em mama
testículo atônito ante nódulo 
amálgama de fins e afins
eis o quimono desbotado
luta sem fim
dos seres querentes de mal de amor amado
que quase explodem o poema
que aqui aparece interligado

mas que nem assim
é grande coisa 
apesar de que, de tudo - e de todos -
me deixou contente
porque sim
escrevi um 
poema
mesmo que ele não fosse grande coisa
porque um poema é sempre umbigo do mundo
e nunca 
o umbigo do poeta
por mais que estes
o queiram fazer parecer

e assim
ao escrever um poema
mesmo que ele não seja grande coisa
senti-me como arco flecha e alvo
de mim mesmo
o mesmo
a duras penas
ainda
conquanto penso*
contente
mundo à fora



e me senti ainda mais contente
porque
embora às armas
não escrevi receita 
não escrevi fórmula
não escrevi sentença 
não escrevi decreto
não escrevi lei
não escrevi pena de morte
não escrevi por vingança
de e do que quer que seja
tampouco elegia
ou poema pimba de amor
apenas escrevi poema
que eu e ele
sabemos bem 
não é grande coisa

mas fiquei muito contente
por isso mesmo 
porque hoje escrevi um poema 
mesmo que ele não seja grande coisa
fiquei muito contente
porque um poema não deixa de ser uma ordem da vida
ditada pelo próprio poema
que nos toma os braços e a cabeça, dos ombros às mãos, nevralgia até as pontas dos dedos
e nos leva às teclas onde os tlecs e tlacs
afinam laços com as batidas do coração
que percutem
e repercutem
o poema
até vê-lo
impresso para além
do próprio
corpo
batido
e rebatido
dundun 

por isso
e só por isso
hoje eu fiquei muito contente 
porque escrevi um poema

e os poemas - assim como os poetas -
não ficam contentes - ou tristes - à toa
eles sempre tem seus (bons) motivos (ou maus)
para escrever um poema
mesmo que o poema não seja grande coisa

escrevesse o mundo mais poemas
e o nosso contentamento seria singular e coletivo
e não apenas mais um poema
que deixou seu autor contente
 - mesmo que o poema não seja grande coisa -
porém sozinho

porque se todos escrevessem um poema
mesmo que o poema não fosse grande coisa
nos faria a todos explodir de contentamento
e não em sangue 
como explodem todos que não ficam contentes com quem escreve poemas

e assim 
o poema finalmente seria uma grande coisa
e poderia morrer em paz
(mesmo que ele ainda achasse que não era grande coisa)

mas como ninguém se dispôs a escrever coletivamente um poema
mesmo que ele não fosse grande coisa
o poema se tornou vazio
e singular;
e o pòete
maudit
pó  
de contentamento
coletivo
o tal de pirlimpimpim
que ninguém soube usar



*penso, usado no nordeste como o equivalente de torto, empenado e, obviamente de pensar

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