Monday, January 15, 2007

a cratera do nosso caráter

para cada um que está trabalhando, calcule pelo menos dez que ficam olhando.

é o retrato do brasil em qualquer situação. curiosidade mórbida. que as vezes até confunde-se com solidariedade. mas que no entanto jamais se manifesta sobre nossas mazelas e sofrimentos mais ou menos sutis nem por isso menos profundas. por maior que seja a cratera em que estamos metidos, fazemos de conta que não há buracos,fissuras ou infiltrações, deitados em berço esplêndido, soterrados que estamos pelo desmoronar de esperanças que jamais serão concretadas.

no meio disso tudo, sim, não se contabiliza parentes, colegas, imprensa marrom, ou mesmo daqueles oportunistas que descem ao fundo do poço para aproveitar o buraco que vai ocupar nas primeiras páginas. afinal, não é porque um governador se chama serra, que ele vai ter alguma utilidade concreta na remoção ou mesmo no comando dela, ativo se fosse.

curiosos e mais curiosos. pitaqueiros e mais pitaqueiros, cujo rescalado não vale o oxigênio que respiram consomem o ar que esfumou-se há três dias e que já não propaga mais sinais telefônicos ou buzinhas e abafa vidas, que ficam a depender de um bolsão de oxigênio sabe-se lá por arte de qual diabo ou deus destacado para dar aos bombeiros algum estímulo ante um desfecho que já se imagina com gosto de terra, porque por maior que seja o perigo, socorro tardio, para quem não tem mais tempo de acompanhar três dias de resgate uma vez que não estão na beira do precipício mas sim enterrados nele.

o acidente do metrô de são paulo é o tunel raso e enlameado. nem por isso menos profundo, de uma crônica de morte anunciada, ou melhor denunciada, que acompanham as vítimas das obras de engenharia públicas deste país, desta vez indo buscar nas cercanias transeuntes que experimentam as agruras do metrô antes dele ficar pronto.

aos sobreviventes que tiveram a sorte de escapar, espera-lhes o soterramento de uma burocracia que vai torcer para que eles morram de outras causas antes de receber o seguro, que deveria ser acrescido da indenização sobre a irresponsabilidade de quem sabedor dos sinais, vez vista grossa até não poder mais ignorar tamanho buraco que como todos ceifam vidas que poderiam estar tapando outros de calibre menor.

é sempre bom lembrar, para os bem intencionados de plantão, que as leis também dizem que protegem os passageiros dos vôos que foram tratados abaixo de cão recentemente, e sequer receberam a atenção de uma informação, muito menos comida e hospedagem e nunquinha de nada de idenização por prejuízos causados, conforme assegura um tal código do consumidor, tão difuso em sua aplicação, como o mapeamento do trágego aéreo brasileiro.

sim, há crateras no ar também do brasil. afinal, neste país, onde delas não se ouviu ainda falar depois da hora da morte ?

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