Wednesday, December 28, 2011

cicatrizes de fecho-éclair


2012 à vista(para alguns eternamente a prazo). misterwalk encerra a quase hercúlea tarefa de encerras as malas(antes fossem os malas) que nada mais complicado por insistir em fazê-las como sempre e não da forma e conteúdo simplesmente simples. afinal, se desta vida nada se leva, para que querer levar-e trazer- tantas coisas? numa mala que mal cabe uma laranja e nela queremos transportar o mundo, ou melhor, os mundos, despedaçados por onde andamos? nisto e aquilo algo que também temos culpa ao contribuir de alguma forma para este despedaçamento, mesmo que seja a custa de alguns pedaços de nós mesmos, ainda que incrustados em pedaços de construções outras julgadas à revelia como indespedaçáveis.

acompanhante, daqueles que a cada item tudo pergunta, tudo contesta - isso não, só vai ocupar espaço e aquilo, não vai levar?(ainda bem que ele não vai), pergunta, o que estava demorando? - vai pra onde? fazer o quê? - vou para portugal. vou sofrer.
e antes que o silêncio se torne mais um item a ser embalado sem a régua da necessidade respondo e encerro a conversa como se um acorde de paredes acordasse por sobre o frio da sua e das nossas colunas: que lugar, senão portugal, para se sofrer com o prazer que já foi caro a cada um de nossos heterônimos?

a propósito - e não foi porque não coube na mala - deixo-lhes o poema do fecho éclair do antonio gedeão, que certamente não sabia que fecho éclair ou zíper, também se chama rí-rí). deixo-lhes outras coisas mais que não vou precisar em portugal. a falta só incomoda quando se tem tudo que revela o tédio de quem não fez e não lhe fizeram faltas.

" Filipe II tinha um colar de oiro

tinha um colar de oiro com pedras

rubis.

Cingia a cintura com cinto de coiro,

com fivela de oiro,

olho de perdiz.

Comia num prato

de prata lavrada

girafa trufada,

rissóis de serpente.

O copo era um gomo

que em flor desabrocha,

de cristal de rocha

do mais transparente.

Andava nas salas

forradas de Arrás,

com panos por cima,

pela frente e por trás.

Tapetes flamengos,

combates de galos,

alões e podengos,

falcões e cavalos.

Dormia na cama

de prata maciça

com dossel de lhama

de franja roliça.

Na mesa do canto

vermelho damasco

a tíbia de um santo

guardada num frasco.

Foi dono da terra,

foi senhor do mundo,

nada lhe faltava,

Filipe Segundo.

Tinha oiro e prata,

pedras nunca vistas,

safira, topázios,

rubis, ametistas.

Tinha tudo, tudo

sem peso nem conta,

bragas de veludo,

peliças de lontra.

Um homem tão grande

tem tudo o que quer.

O que ele não tinha

era um fecho éclair."

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