2012 à vista(para alguns eternamente a prazo). misterwalk encerra a quase hercúlea tarefa de encerras as malas(antes fossem os malas) que nada mais complicado por insistir em fazê-las como sempre e não da forma e conteúdo simplesmente simples. afinal, se desta vida nada se leva, para que querer levar-e trazer- tantas coisas? numa mala que mal cabe uma laranja e nela queremos transportar o mundo, ou melhor, os mundos, despedaçados por onde andamos? nisto e aquilo algo que também temos culpa ao contribuir de alguma forma para este despedaçamento, mesmo que seja a custa de alguns pedaços de nós mesmos, ainda que incrustados em pedaços de construções outras julgadas à revelia como indespedaçáveis.
acompanhante, daqueles que a cada item tudo pergunta, tudo contesta - isso não, só vai ocupar espaço e aquilo, não vai levar?(ainda bem que ele não vai), pergunta, o que estava demorando? - vai pra onde? fazer o quê? - vou para portugal. vou sofrer.
e antes que o silêncio se torne mais um item a ser embalado sem a régua da necessidade respondo e encerro a conversa como se um acorde de paredes acordasse por sobre o frio da sua e das nossas colunas: que lugar, senão portugal, para se sofrer com o prazer que já foi caro a cada um de nossos heterônimos?
a propósito - e não foi porque não coube na mala - deixo-lhes o poema do fecho éclair do antonio gedeão, que certamente não sabia que fecho éclair ou zíper, também se chama rí-rí). deixo-lhes outras coisas mais que não vou precisar em portugal. a falta só incomoda quando se tem tudo que revela o tédio de quem não fez e não lhe fizeram faltas.
" Filipe II tinha um colar de oiro
tinha um colar de oiro com pedras
rubis.
Cingia a cintura com cinto de coiro,
com fivela de oiro,
olho de perdiz.
Comia num prato
de prata lavrada
girafa trufada,
rissóis de serpente.
O copo era um gomo
que em flor desabrocha,
de cristal de rocha
do mais transparente.
Andava nas salas
forradas de Arrás,
com panos por cima,
pela frente e por trás.
Tapetes flamengos,
combates de galos,
alões e podengos,
falcões e cavalos.
Dormia na cama
de prata maciça
com dossel de lhama
de franja roliça.
Na mesa do canto
vermelho damasco
a tíbia de um santo
guardada num frasco.
Foi dono da terra,
foi senhor do mundo,
nada lhe faltava,
Filipe Segundo.
Tinha oiro e prata,
pedras nunca vistas,
safira, topázios,
rubis, ametistas.
Tinha tudo, tudo
sem peso nem conta,
bragas de veludo,
peliças de lontra.
Um homem tão grande
tem tudo o que quer.
O que ele não tinha
era um fecho éclair."
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